Cabe a nós - por Anderson Teixeira

Esses últimos meses foram reveladores. Inúmeros acontecimentos passaram diante dos meus olhos. Não consegui digerir tudo ou tive medo de crer no que via.

Assisti a um país vomitar sobre seu solo todo  o “suco” corrosivo que a muito trazia em suas entranhas.

Resolvi tirar o fone de ouvido e comecei a ouvi e observar grupos de conversas em ônibus, bares, lanchonetes, em portais e fóruns na internet. Algumas pessoas diziam que só achavam “que se ela não quisesse ser estuprada, não deveria andar vestida com roupas curtas, então ela pediu”. Notei pessoas exaltando a ditadura como um período de ordem e progresso que deveria retornar ou gente que acredita que a solução para violência esta na diminuição da idade penal.

De um lado ouvia pessoas falarem que preconceito, racismo só existem na cabeça de quem gosta de ser vítima, mas olho uma sociedade onde o ser negro é rejeitado e manipulado, desde padrões estéticos à profissionais. Cabe a pergunta: que liberdade foi essa proclamada em 1888?  Do outro lado me deparo com matérias com títulos como “Criança é apedrejada por pertencer à religião do Candomblé”, ou “Rapaz é agredido por grupo de jovens por segurar mão do irmão”, ou “Mulher é insultada, ameaçada, e humilhada em rede social por ser negra”. Talvez tenham feito confusão entre cordialidade e intolerância ao nos adjetivar.

Sejam em bancas de jornais ou simplesmente ligando a tv, acompanho alguns meios de comunicação tentando enfiar goela abaixo dos seus expectadores aquilo que eles querem que seja a verdade, inflamando o ódio, alimentando os conflitos e, assim, trazem um caos onde ninguém se ouve, se vê e, por consequência,  não se entende, mas cheios de si,  proclamam estarem trazendo a clareza ou tentando manter o país informado e seguem camuflando suas intenções.

Mas, em meio a tudo isso, ainda existe esperança e uma forte crença que chegaremos num lugar onde poderemos ser melhores cidadãos, humanos. Afirmo isso porque convivo com pessoas, vejo ações, que vão muito além da utopia, e colocam esses sonhos no fazer, buscam mudanças, e já colhem resultados, digo isso porque sou um “resultado” dessas iniciativas, e a cada dia mais e mais pessoas unem-se a essa corrente.

Estamos tão perdidos agora porque sempre foi determinado quem éramos, mas esqueceram de perguntar a nós o que somos. Todo esse conflito veio para expor o que estava escondido e agora teremos que nos olhar no espelho para nos ver, mas não só em unidade, mas como um corpo maior, formado de milhares. Que no final soem aplausos por termos apresentado um bonito espetáculo nesse palco da vida e da nossa história.